quinta-feira, 10 de julho de 2014

Teresa Salgueiro em entrevista ao Contacto



Boa tarde,


Segue entrevista que Teresa Salgueiro concedeu ao repórter Henrique de Burgo, do jornal Contacto.lu:

"Depois de vinte anos a dar voz aos Madredeus, Teresa Salgueiro regressa ao Luxemburgo a solo esta sexta-feira para apresentar o seu primeiro álbum de originais, “Mistério”, no festival OMNI, na Abadia de Neumünster. Em entrevista ao CONTACTO, a cantora convida os fãs a descobrir o seu mais recente disco, fala da saída dos Madredeus e revela que está a preparar um novo álbum.

CONTACTO – Já cá esteve várias vezes com os Madredeus e com outros músicos. Quando actua no Grão-Ducado, onde há uma grande comunidade portuguesa, sente-se em casa, ou para si qualquer palco é a sua casa?
Teresa Salgueiro – Claro que é bom saber que há pessoas que entendem as palavras cantadas, o que é sempre especial, mas sabemos que estamos fora do país e que não é só a comunidade portuguesa que está presente. Não será propriamente como tocar em casa. Mas por poutro lado, procuramos fazer de cada palco a nossa casa, sem dúvida.

CONTACTO – Em 2012 lançou “O Mistério”, o seu disco mais recente e o seu primeiro álbum de originais. Vem agora apresentá-lo num local onde costuma actuar, o centro cultural Abadia de Neumünster. Como é que acha que vai ser recebida, agora a solo?
Teresa Salgueiro – A última vez que estive na Abadia, um lugar belíssimo, foi com o projecto “Você e eu”, em 2008, dedicado à interpretação do cancioneiro brasileiro. Correu muito bem. Desta vez vou com o repertório de “O Mistério”, mas não só. Este álbum, que é como um recomeço para mim, tem sido muito bem recebido por onde tem passado e espero também que as pessoas estejam preparadas para ouvir algumas músicas que talvez não conheçam.

CONTACTO – “O Mistério” foi gravado num convento, um local de retiro espiritual. Este álbum tem também um lado espiritual?
Teresa Salgueiro – O disco foi gravado no convento da Arrábida, aliás numa hospedaria que faz parte da estrutura e onde foi possível construir um estúdio. Não queria um estúdio convencional, mas sim um espaço de recolhimento, onde pudéssemos estar focados e entregues à gravação. Sobre as letras das canções que escrevi, são uma reflexão da dimensão humana perante o mistério da vida, daí o nome “O Mistério”, que é também um dos temas do álbum. Estamos juntos na vida e sabemos que há muitas coisas que não conhecemos e nem vamos conhecer. Não é suposto conhecer toda a realidade. Se aceitarmos esta nossa condição, compreendemos melhor a nossa dimensão, a nossa fragilidade e pequenez perante o universo que nos rodeia. Mas também é preciso lembrar que somos criadores e com cada palavra e cada gesto podemos transformar o mundo num lugar mais justo. É esse o exemplo que a música me dá e que me motiva a fazer música.

CONTACTO – Apesar de ser um álbum a solo, este é também o resultado de um trabalho colectivo. Como foi todo esse processo de criação com os músicos que escolheu para este álbum?
Teresa Salgueiro – Foi um processo muito interessante. Como a linguagem é comum, a ideia era que cada um de nós pudesse intervir na música. De certa forma eu sou o filtro da música que se vai criando, mas cada pessoa tem espaço para criar aquilo que vai tocar. A música pode nascer de uma melodia de voz que inventei, de uma frase ou do acorde de uma guitarra. Passámos muito tempo juntos para que a música cresça e se encontre um caminho. É um tipo de trabalho que implica muita cumplicidade e partilha. Durou de Janeiro a Julho de 2011. Foi depois gravado a partir de Agosto desse mesmo ano e saiu em Maio de 2012.

CONTACTO – Depois de um percurso de 25 anos de dedicação ininterrupta à música, apresenta-nos 17 faixas com músicas e letras de sua autoria. Para além da sua voz, ainda que agora com mais matizes, “O Mistério” tem alguma coisa de Madredeus? Como define a musicalidade deste trabalho?
Teresa Salgueiro – Em termos de espírito há uma certa continuidade, mas a música é muito diferente. Quis fazer uma música que não renegasse o meu passado, mas que fosse inovadora. Quanto à sonoridade temos o contrabaixo, acordeão e guitarra que poderão fazer lembrar coisa. Nos Madredeus não tínhamos contrabaixo, mas violoncelo, mas são instrumentos que estiveram ligados à minha voz durante muito tempo. Não quis negar o meu passado, mas viver uma coisa diferente.

CONTACTO – Esteve 21 anos nos Madredeus (1986-2007), editou quatro álbuns com outros artistas entre 2005 e 2009, e gravou com grandes nomes da música portuguesa e mundial. Que retrato faz do seu percurso musical?
Teresa Salgueiro – São muitos anos de música, com um percurso muito longo, rico e diversificado. Só a aventura dos Madredeus é uma coisa única na música portuguesa. Nunca um grupo português foi tão longe a tocar música original, criada por portugueses. Dentro desse percurso a própria banda mudou. Saíram e entraram músicos, o estilo musical também foi crescendo. Ainda nos Madredeus, enquanto o grupo estava parado, editei dois discos, “Você e eu” e “La serena”, produzidos por Pedro Ayres Magalhães. Isso foi entre 2006 e 2007, período em que andei também em ’tournée’ com outro projecto, “Silence, Night and Dreams”, do compositor polaco Zbigniew Preisner. Para mim é um retrato feliz na música, com grande amor, dedicação e aprendizagem, tanto com os Madredeus, como com o percurso que tenho vindo a fazer sozinha, ou com os músicos que convidei para trabalhar comigo. Hoje em dia a indústria da música mudou e as coisas estão complicadas, mas graças a Deus que até hoje não fiz outra coisa na minha vida a não ser música. Sinto-me privilegiada.

CONTACTO – Mantém ainda contacto com os antigos colegas dos Madredeus?
Teresa Salgueiro – Não, não temos contacto. Se os encontrar, cumprimentamo-nos [risos]. Cada pessoa seguiu o seu caminho.

CONTACTO – Ainda há esperança de ver e ouvir um dia os Madredeus novamente reunidos, nem que seja para alguns concertos?
Teresa Salgueiro – Eu não sou a única pessoa do grupo e não devo responder por todos. As coisas têm e tiveram o seu tempo. As pessoas seguiram percursos diferentes, não mantemos contacto e neste momento não sei se faz sentido ou se algum dia fará.

CONTACTO – Vai manter-se a solo? Tem novos projectos?
Teresa Salgueiro – O projecto tem o meu nome, mas não posso dizer que me mantenho a solo, até porque estou sempre acompanhada por um núcleo de músicos que se mantém, apesar de algumas alterações. Projectos... Estou num processo de composição. Há temas novos que estão a ser escritos e que hão-de vir a ser gravados o mais breve possível. É a isto que me estou a dedicar, à composição e à gravação de um novo disco, com o mesmo núcleo de músicos.

CONTACTO – Há algum nome com quem gostaria ainda de vir a trabalhar?
Teresa Salgueiro – Tive a felicidade ao longo destes anos de conhecer muitos artistas e gravar alguns discos com alguns deles. Em 2005 saiu o disco “Obrigado”, que juntou várias dessas colaborações. Foram-me convidando, não foi um plano meu. Se fosse um plano meu, pensaria na cantora brasileira Marisa Monte, que é uma pessoa com quem gostaria muito de cantar, mas neste momento estou preocupada em fazer música.

CONTACTO – Uma palavra para os seus fãs no Luxemburgo.
Teresa Salgueiro – Espero que as pessoas possam estar presentes e convido-as a ouvir esta música diferente, que certamente pouca gente conhecerá. Espero que seja um bom momento de música, que valha a pena. Vamos dar o nosso melhor, como sempre.

Henrique de Burgo

O concerto vai ter lugar esta sexta-feira às 21h no átrio da Abadia de Neumünster, no Grund, na capital. Os bilhetes custam 27 euros. Mais informações pelo tel. 26 20 52 444 ou na internet (www.ccrn.lu). O festival de música ao ar livre organizado pelo centro cultural Abadia de Neumünster, baptizado Objectos Musicais Não Identificados (OMNI), comemora este ano a décima edição com um “best off” dos artistas que passaram por lá na última década, incluindo, além de Teresa Salgueiro, Youssou N’Dour e Joss Stone."


(Foto: Federica Borgato)

Nenhum comentário:

Postar um comentário